domingo, 13 de outubro de 2013

Pensamentos miscelâneos




A separação do Estado da religião, conhecida como laicidade, constitui ganho civilizatório ou apenas um traço cultural do ocidente? E o capitalismo, não é ele professado com um fanatismo religioso como se não houvesse outra alternativa?

O certo é que em tempo de guerras não só capitalistas, mas “religiosas”, este mundo, velho mundo, parece andar de mal a pior, para não dizer sem rumo.

A notícia de dias atrás mostra que uma escola tida como excessivamente “ocidental” gerou uma chacina de crianças na Nigéria; passa-se uns dias, abre-se o jornal e vê-se que albinos são perseguidos e mortos na Tanzânia, onde ainda acredita-se em bruxarias, pois seriam, pasme-se, seres inferiores e amaldiçoados; homicídios plurais e estúpidos continuam sendo praticados todos os dias, inclusive no trânsito, onde morrem mais de 40 mil pessoas no Brasil sem que nada efetivamente mude, a não ser mais descoberta de corrupção em obras públicas de trens e metrôs envolvendo conglomerados internacionais.

De outro lado, acentuando o grau de doença de uma sociedade que parece não saber lidar com a sexualidade de maneira saudável, e aqui os moralismos religiosos também cobram elevado preço, veja-se a absurda profusão de crimes sexuais na Índia para perceber como o ser humano tem dificuldade para administrar mesmo algo que lhe é inerente e natural. Até que ponto preconceitos e mutilações castradoras de desejos geram as anomalias sexuais patológicas é um dos pontos a se pensar. Talvez se tivéssemos uma “erótica solar”, menos cheia de impregnações e razões, como diz Onfray, pudesse ser diferente, não?

O fato é que todos esses acontecimentos nos fazem repensar os marcos civilizatórios e permitem contestação séria aos otimistas que acreditam que o domínio sobre a natureza trouxe “progresso”. Isso tudo obriga a pensar o quão pouco parecemos ter avançado na aplicação das ciências humanas, ciência, este instrumento tão idolatrada pelo espírito moderno.

Ao lado disso, sobram paradoxos e surpresas, um dos quais a retomada das relações entre Estados Unidos e Irã depois de 1979: o dia em que a teocracia reencontra um curioso formato de “democracia”.
Em compensação, o diálogo internacional parece ter resolvido o problema da Síria, incentivando (iludindo?) quem ainda crê na diplomacia que se exerce pela razão comunicativa, ainda que os motivos sejam outros e mais remotos.

Estados Unidos da América onde, pelo menos, o fato de o Presidencialismo não ser de coalizão, permite equilíbrio de forças com o Parlamento, o que mostra que as crise de governabilidade atualmente integram a agenda de qualquer regime, mesmo aqueles com maior tradição “democrática”, por mais que adjetivo seja incoerente com uma série de coisas, Guantánamo, “vigilância eletrônica” e outras “armas” dos tempos contemporâneos ditados pela velocidade e força da informação.

Nós, por enquanto, entre outras mazelas, em terrae brasilis (para lembrar Lenio Streck), temos que aguentar uma Justiça Eleitoral que custa caro e não coloca sua estrutura informatizada para eleições não oficiais de conselheiros tutelares a conselhos sociais e, pior do que isso, não consegue se organizar para registro de novos partidos, isso tudo numa arquitetura democrática que precisa ser repensada, inclusive quanto a efetividade dos espaços de jogo institucionais.

Menos mal que o problema da crise da democracia atualmente ocupa a pauta de um União Europeia mantida ao custo da opressão da soberania de muitos em prol da ditadura econômica e política imposta pela Alemanha e França. 

E a Primavera Árabe, afinal, no que consistiu? Qual a análise? Se há um exemplo de tristeza e frustação de expectativa esta passa pela complexidade da situação no Egito, onde os militares deram um golpe sorrateiro e lá estão, inclusive com o financiamento do governo “estadunidense”.

E a “repristinação” da Lei de Segurança Nacional para prisão de manifestantes com máscaras e vinagre em pleno e franco direito ao protesto. Foram vinte e cinco anos da Constituição e sequer temos polícias minimamente democráticas...

Pior que isso só mesmo aguentar nas notícias da “pré-falência” do  “agora menos milionário” Eike Batista, as projeções eleitorais em cima de “pesquisas” que, curiosamente, juram acertar os resultados em um país de 200 milhões de habitantes (quando na verdade influem perniciosamente o voto), isso tudo num país onde alguns governos estaduais fazem cortes lineares enquanto mantém verbas altíssimas de publicidade em verdadeira propaganda eleitoral antecipada.

Há uma cisão entre as demandas e a necessidade de uma nova política e o que se discute é o quadro eleitoral, alianças e projeções, não o sistema, não o necessário redimensionamento das relações de poder, que poderia começar pelo “poder cidadão” como prova da necessidade de superarmos a concepção tripartida de poderes de sabor europeu.

Sem a reforma radical de um modelo de “comunicação social” desprovido de preocupação e controle público para difusão de cultura e educação, que permite monopólios econômicos (bem lembra João Brant) reprodutores da alienação do lixo, concessões de rádio e televisão que na sua grande maior parte são relacionadas a agentes políticos, aí mesmo é que não vai. E não se diga que há limite de cinco emissoras para um mesmo grupo, pois sabemos que as “afilhadas” e os “laranjas” completam o serviço sem que nada acontecida... Dentre muitas lutas, é tempo de se lutar pela democratização da comunicação (e aqui louvo a iniciativa importante do Intervozes e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação). Alternativa de alternativas, como diria Boaventura, é o que precisamos.