domingo, 10 de fevereiro de 2019

Por que não acredito no Governo Bolsonaro






"Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia"
Chico Buarque

Uso minha liberdade de expressão para dizer que não vejo mínimas razões para acreditar no recém empossado Governo do ex-Deputado Federal, agora Presidente, Jair Messias Bolsonaro. Apesar do seu nome, não o vejo como "salvador" de absolutamente nada. Ao contrário, o vejo como um "risco" e um "perigo" concreto à democracia, à soberania nacional e aos direitos humanos. Um verdadeiro retrocesso. 

Só mesmo um país como o Brasil, que nunca teve justiça de transição, para eleger alguém que não reconhece que tenha havido uma Ditadura Militar (1964-1985) com muitas vítimas. Mais do 
que isso, quem celebra e zomba da tortura como terror.

Não é possível acreditar em alguém que fala em "verdade" da Bíblia, mas que, quando candidato,fez uma campanha baseada em muita mentira, "acima de tudo" e "acima de todos".

 Não é possível ter esperança com alguém que prega a violência e as "armas" como resposta. 

 Bolsonaro, parlamentar medíocre por quase trinta anos (sete mandatos), com diversas propostas de leis absurdas e dois projetos aprovados, definitivamente, não tem nada de novo, ainda que incrivelmente tenha conseguido se "vender" como tal. 

 Também não acredito que Bolsonaro represente alguma mudança no combate à corrupção. A corrupção também está nos cargos comissionados providos indevidamente, inclusive para familiares. Os fatos (e "costumes") falam por si.

 O discurso de ódio (ou odiento) de Bolsonaro é pobre como o senso comum dos seus tuítes. Nele não há nem o mínimo rascunho ou esboço de um projeto para desenvolvimento do país, sobre os nossos reais e históricos problemas. 

 Bolsonaro fala em submissão ideológica, certamente sem condições de resistir a um debate mínimo sobre o que seja ideologia, inclusive a sua. A sua colonialidade do "saber" dispensa apresentações. Muitas e evidentes são as suas limitações, em todos os sentidos. 

 Alguém que promete uma política externa favorável aos excessos Israel, contrária à integração da América Latina e subserviente ao Império Estadunidense, já mereceria todas as reservas. Trata-se da colonialidade do poder posta em prática. 

 E o que dizer de um militar reformado (aliás, sob curiosas e particulares circunstâncias) que, antes de ser um nacionalista de verdade, escolhe um Ministro da Economia (que, como diria Paulo Passarinho, está mais para um "Ministro da Liquidação") que é um "chicago boy" e aparente "vende-pátria"?

Desculpem os ingênuos ou mal intencionados: esse "mito", para lembrar de Fernando Pessoa, 
está muito mais para "nada" do que para "tudo".

 Sem nunca ter tido um governo verdadeiramente de esquerda (muito longe disso), o Brasil está 
condenado a quatro anos de um governo de extrema-direita, que provavelmente fará muito estrago no já erodido e ausente Estado social brasileiro.

Mesmo numa eleição com 30% de abstenção, brancos e nulos, o fato é que a maioria dos brasileiros elegeu o "mito" como Presidente (o "ele sim!" venceu o inédito "ele não") e, agora, justa e merecidamente, deverá provar do seu tosco "gatilho". 



terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Roma: uma obra bem acabada de Alfonso Cuarón





O México no começo dos anos 70 em preto e branco, mas pintado com cores vivas do seu presente, a despeito da expectativa de alguns sobre o novo governo.

Luis Echeverría Álvarez, Presidente do México de 1970 a 1976.  O sempre latente conflito de terra. A violência dirigida contra o protesto que (depois de Tlatelolco, dias antes dos Jogos Olímpicos, em 02 de outubro de 1968), com a ajuda de um grupo paramilitar a serviço do Estado (Los Halcones) que, munido de bambus e armas de fogo,  massacrou estudantes (conhecido como El halconazo) no triste 10 de junho de 1971, chancelado por uma brutal e inaceitável impunidade. Essas são algumas cenas de fundo do México daquele tempo.

No meio disso, no foco principal da lente cinematográfica, a vida de uma família pequeno burguesa entre cães (e seus dejetos), carros e filhos em um bairro de classe média da Cidade do México.

Uma empregada doméstica (Cleo) de origem indígena, ora tratada como mera subalterna, ora com alguma humanidade, ora como se realmente fosse alguém da família. As relações de classe.

A pobreza da periferia da Cidade do México e a falta de saneamento básico. A desigualdade social.

O compromisso (ou não) dos pais com os filhos e o conflito com o trabalho. A ruptura familiar escondida.  A ausência do pai.

A decepção amorosa. A fatalidade. O sacrifício.

Para além de uma expressão intimista e autobiográfica do Diretor, basta atentar para os principais personagens para perceber que se trata de uma reflexão sobre a condição humana e proletária da mulher com um bom flerte feminista.

Pena que o Cuarón não investiu mais e melhor na contextualização do drama político e social mexicano. Tais questões aparecem latentes, mas de modo não contextualizado e insuficiente.

Isso e tudo mais está no filme "Roma", uma obra bem acabada e acertada do Diretor mexicano Alfonso Cuarón (disponível no Netflix e premiado como melhor filme com o "Leão de Ouro" no 75o Festival do Cinema de Veneza).