quarta-feira, 1 de abril de 2009

Conselhos Sociais: espaços de democracia participativa desconhecidos e ainda simbólicos...à espera da revolução

Após o advento da merecidamente festejada Constituição da República de 1988, assentada a idéia do Estado Democrático de Direito como opção efetiva para transformação da perversa e historicamente injusta realidade social brasileira (artigo 1º, CR), inegável reconhecer que os “Conselhos Sociais”, ao lado dos sempre esquecidos instrumentos do plebiscito, referendo e iniciativa popular (artigo 14 da CR – cuja escassez de uso pela desacreditada classe política mostra o quão embolorado e atrasado está o nosso ainda materialmente “totalitário” modelo de nação), constituem-se em poderosos e decisivos instrumentos de soberania popular para exercício da democracia participativa na otimização e incremento dos direitos fundamentais pela via das políticas públicas.
Resumidamente, se antes da Carta da República as políticas públicas voltadas à coletividade eram tratadas no ar viciado e despótico dos gabinetes, rarefeitos de democracia e não raras vezes alérgicos à interlocução e efetivo contato proativo com a população, por decisão subjetiva única e monocrática do “representante” Chefe do Poder, “jogo” quando muito compartilhado com assessores diretos (comissionados, claro) nas decisões administrativas de suas muitas Pastas e Secretarias, já faz pelo menos 20 (vinte) anos que o assunto exige tratamento diverso e efetiva concorrência, fiscalização, alerta e participação da sociedade. Prejudicando a catalisação e aceleração deste processo, sem dúvida, está o fato de o tema passar invisível aos olhos e alcance de grande mídia, verdadeiro “trem” cada vez mais dominado e forjado no trilho que conduz e transporta o interesse mesquinho, conservador e dominante que, infelizmente, tem partida e destino certo para aqueles que sabem muito bem como fazer para que o maior número de pessoas continue preferindo ficar preso no escuro da metafórica “caverna” de PLATÃO.
Assim, nos dias atuais, assegurar que a sociedade tenha assento em órgãos colegiados que devam se reunir periodicamente para diagnosticar, discutir e deliberar providências e medidas para enfrentamento dos problemas e concretização de políticas públicas de educação, saúde, infância e juventude, meio ambiente, promoção e defesa pessoas em situação de vulnerabilidade social (ex: idosos, portadores de necessidades especiais, etc), mais do que medida simplesmente recomendável, constitui-se em verdadeira exigência e impositiva obrigação de qualquer governo minimamente representativo e sério, que não faça pouco caso da Constituição como maior Lei vigente no país.
Nessa balada, certo é que a expressão sólida da democracia participativa, que nada mais é do que a exigência de que a população seja constantemente chamada a participar do projeto de construção das políticas públicas e efetivação da cidadania, não pode continuar manca, materialmente vazia e destituída de efetividade.A poderosa “arma” dos Conselhos Sociais continua indisponível pela desinformação, alienação e falta de empoderamento efetivo da sociedade para que esta ocupe não só quantitativa (formal), mas qualitativamente (material) esses espaços.
Por mais que hoje existam “Conselhos Sociais”criados e em formal funcionamento e existência em todos os níveis federativos (ex: Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente, Conselhos Estaduais de Educação, Conselhos Municipais do Meio Ambiente, Conselhos Municipais de Saúde, etc), pouco, muito pouco se fala deles.Desafortunadamente, “caro leitor” (para lembrar MACHADO DE ASSIS), a atuação destes organismos colegiados no qual a sociedade civil sempre há de estar representada, geralmente metade das suas “cadeiras”, é muito mais simbólica e ilusória do que, propriamente, expressão de substancial instrumento de democracia participativa.Estes Conselhos Sociais, portanto, ainda ilustres desconhecidos do povo brasileiro (para alegria dos gestores corruptos de plantão), especialmente no âmbito das cidades, não raras vezes tem seu processo de criação e escolha viciado pela falta de legitimidade e maior discussão e esclarecimento das suas atividades junto à população, situação que gera, muitas vezes, o seu funcionamento atrelado e completamente subordinado ao Poder Executivo, perigoso e nefasto espaço “pelego” similar àqueles sindicatos que não cumprem com o seu papel de defender os trabalhadores no enfrentamento do capital e suas mazelas.
A desculpa é sempre a mesma (e falsa): o povo não quer participar. Como se alguém pudesse se interessar e desejar por algo que simplesmente desconhece.Saber que existem Conselhos Sociais que não foram criados, que foram criados sem devida e adequada base-legal, que não se reúnem ou que o fazem à “porta fechada”, sem publicidade e prévio esclarecimento à população, saber que o “clientelismo” ainda paira na deformada e bizarra representação política de muitos colegiados em detrimento e prejuízo da emancipação efetiva da sociedade civil, mais do que “simulacro” e “simulação” (BAUDRILLARD), constitui triste constatação mais do que suficiente para sonharmos com a necessidade da vivência e experiência da educação pela “revolução” e convencimento capaz de mostrar à sociedade a necessidade destes espaços serem aproveitados com decisão, independência, compromisso e discernimento.
Enquanto não houver enfrentamento sério deste tema pelos governantes (inclusive Governos Federais e Estaduais que, aliás, poderiam exigir condições materiais de funcionamento para repasse de recursos e não simplesmente a formal existência desses Conselhos – não fazem!), pela imprensa e pela própria sociedade civil como um todo, a democracia participativa e a edificação de políticas públicas efetivamente voltada aos anseios e enfrentamento das angústias da população mais carente sob o ponto de vista econômico e social ainda continuará sendo realidade distante, posta no plano do “virtual” (ZIZEK).
De outro lado, se cada ser-aí (HEIDEGGER) cidadão (do outro lado da tela), à sua maneira, no seu espaço de cidadão (MILTON SANTOS), souber compreender e divulgar a idéia e o sentido dos Conselhos Sociais, buscar acompanhar diligentemente as suas reuniões, exigir a divulgação e a transparência das atas das suas reuniões (que de preferência devem ser pautadas com antecedência e realizadas em horários aos quais seja possível a participação da sociedade) para, no fim das contas, cobrar medidas propositivas e efetivas para os problemas sociais experimentados, aos poucos o quadro começa a mudar.
Isso porque, apesar de tudo, a esfera de decisão dos Conselhos Sociais vincula o administrador e o gestor público a efetivar o desejo e o anseio materializado pelo seu funcionamento. O que se delibera, o que se decide por instrumento da sociedade, não se discute, se cumpre! Talvez por isso não haja interesse na verdadeira capacitação destes atores e no fortalecimento deste espaço.
Parte eficiente da “munição”, certamente, deve estar na aproximação que precisa ser cada vez maior entre o Ministério Público e a sociedade, já que à instituição cabe exercer a defesa dos interesses da coletividade.
Mobilizar e esclarecer a população da importância da tomada coletiva e efetiva destes espaços precisa constituir marcha e grito de ordem democrática. Já é mais do que hora de começar a mudar e virar a página desta história da qual a geração que nos é contemporânea está sendo testemunha passiva, quando não propriamente omissa. Na temática dos conselhos sociais, definitivamente, entre a teoria e a práxis, the time it is out of joint (SHAKESPEARE em “Hamlet”), o tempo (e povo), estão, fora do seu eixo...
A propósito, como ensina DERRIDA[1], vencidas a cênicas idéias contidas no teatro revolucionário do processo de tomada de poder em 1789 (Revolução Francesa na sua liberdade-igualdade e fraternidade ainda esperadas), na “primavera dos povos” do Manifesto Comunista de MARX e ENGELS e na Revolução Russa de 1917 e a posterior “corrupção” do seu projeto, superada a desumanidade e os traumas do pós-Guerra (1945), ainda é possível crer na revolução como interrupção radical no curso ordinário da História. Afinal, toda a responsabilidade é revolucionária e, por conta disso, é preciso reinventar condições de resistência (SABATO[2]).
Os Conselhos Sociais enquanto instâncias democráticas de imprescindível pertencimento social precisam sair do “papel” no rompimento de seu luto para ganhar “vida”, corpo e alma, forma e matéria. Estes valiosos colegiados não podem se constituir em ideais sonegados capazes de jogar esperança no túmulo, até porque, como ensina DERRIDA, o extravio de um ideal ou de uma esperança é a pior das coisas, como a condenação à morte do imaginário.
Afinal de contas, na crise da representatividade da democracia tupiniquim, não se pode esquecer e perder a utópica e necessária crença de que, nos termos do artigo 1º, parágrafo único, da maior Lei deste país, todo o poder emana do povo que tem o poder-dever de exercê-lo diretamente nos termos da Constituição.
A soberania do Estado laico-secularizado, definitivamente, não pode estar com Deus(es) ou Mito, nem com o rei, muito menos de modo exclusivo com as mãos de todo e qualquer governante da República. A verdadeira e genuína soberania não se constrói sem compartilhamento, discussão e participação direta do povo.
O que estamos esperando para a luta e tomada de consciência na realização do "controle social"?


[1] DERRIDA, Jacques. ROUDINESCO, Elisabeth. De que amanhã – Diálogo. Editora Jorge Zahar, 2004.

[2] SABATO, Ernesto. A resistência. Editora Companhia das Letras, 2009.

4 comentários:

  1. BBB do poder? seria uma boa?.....rssssssss

    abraços...
    Hugo Perpétuo

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  2. impressionante falar é facil quero ver fazer ta ai a dificuldade....

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  3. INDEPENDÊNCIA,CONSCIÊNCIA CRÍTICA, DISCERNIMENTO,ISENÇÃO E COMPROMISSO SÃO REQUISITOS ESSENCIAIS PARA OS CONSELHEIROS.PENA QUE MUITOS BUSCAM APENAS AUFERIR VANTAGENS DESTA FUNÇÃO.

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  4. basta nos perguntarmos, estamos satisfeitos
















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