Pablo Neruda é uma daquelas personalidades que, sem dúvida, enaltecem e consolidam a crença de que um horizonte mais próspero e humano não só é verdadeiramente possível, como também constitui bruta e utópica necessidade para equilibrar tempos de excessiva liquidez.
Chileno, nascido em Parral (12 de julho de 1904), o genial poeta Ricardo Neftali Reyes Basoalto, brindado com o célebre e imortal apelido em homenagem ao theco Iovato Jan Neruda (também poeta), teve vocação para viver com intensidade, inteligência e sensibilidade suficiente, virtudes que lhe permitiram descrever de modo concreto a paradoxalmente abstrata essência das coisas, até o limite...
Tanto é assim que a vida de Pablo Neruda não resistiu muitos dias mais ao genuinamente catastrófico 11 de setembro de 1973, data marcante do histórico golpe militar que sacou seu amigo pessoal Salvador Allende do então democrático e emancipatório governo chileno, mais uma cínica cena entre tantas violências patrocinadas pelo sistema-mundo estadunidense no restante da América Latina.
Em tempos de globalização neoliberal desumanizante, recortar e bricolar um pouco desses fragmentos pode fazer toda a diferença. Assim, se recordar, na origem do termo, é, como ensina Galeano, transpor fatos e lembranças pelo coração, que venha o sabor de “salteados” fragmentos da poética nerudiana em tempo de primavera....
No falta nada en jardín
Y no fuímos capaces de perder la mirada
Y me acostumbré a caminar consumido por mis pasiones
Hay que conocer ciertas virtudes
normales, vestimentas de cada dia
que de tanto ser vistas parecen invisibles
Pero no tuve tiempo ni tinta para todos
Llaman em circunstancias solitárias
Y hay que abrir, hay que oír os que no tiene voz
Hay que ver estas cosas que no existen
Ahora la verdad es el regresso
Mi única travesía es um regresso
Yo soy uno de aquellos que no alcanzó a llegar al bosque
El pan de la palabra cada dia
No hay salida para este volver
A uno mismo, a la piedra de uno mismo
Ya no hay mas estrella que el mar
Apropriação minimamente criativa e subjetiva da sábia filosofia “nerudiana” pode revelar múltiplos emancipatórios sentidos e significados no complexo universo da linguagem...A propósito, será que já não chegou a hora de acordarmos para o amanhã a partir de alguns pontos comuns e de consenso?
Não há maior risco a não ser a própria imaginação e paciência de esperar....
Que tenhamos a sabedoria de não deixar faltar nada de humano ao nosso jardim de cada dia, longe do materialismo banal que nos enfraquece.
Que, mesmo em tempo de pós-modernidade, tenhamos a sabedoria de não perder o olhar sensível, crítico e subjetivo, por mais que a pseudo-segurança das falaciosas interpretações monolíticas estejam de guarda-chuva aberto em cada esquina.
Que saibamos caminhar pela vida consumidos pela paixão no compromisso permanente de nos tornarmos mais solidários, desafio insólito em tempos de individualismo egoísta e desagregador.
Que saibamos conhecer as virtudes e as verdades possíveis com suas roupagens variáveis e relativas de cada dia, sempre duvidando do seu conteúdo e de tudo aquilo que parece claro e indiscutível.
Que a fraternidade não seja invisível e que a exposição midiática dos temas que ocupam o cotidiano permita verdadeira percepção e conscientização do tanto que há por fazer (dizer que "ainda há muito a fazer" seria demasiado otimismo revelador de que estamos fazendo alguma coisa).
Mais...
Que tenhamos tempo e tinta para todos aqueles que gostamos, com os quais compartilhamos os pedaços felizes e substanciais da existência.
Que saibamos ser humildes e tenhamos a esperada alteridade para ouvir os que não tem voz, para ver aqueles que muitos material e economicamente não existem na lenta míope de muitos governos.
Que deixemos um pouco a estética para repensar a ética de uma existência de verdadeira libertação.
Que saibamos a importância do regresso na travessia quando se quer chegar no bosque da simplicidade como caminho.
Que saibamos valorizar a necessidade do pão de cada dia sem outras e menores preocupações, colocando no seu devido lugar excessos supérfluos dispensáveis ou puramente ornamentais.
Que saibamos ver que a saída para uma nova ordem civilizatória está gravada na pedra e na existência de cada um de nós...em nenhum lugar mais.
Que possamos apreciar a criatividade e a força da vida e dos sonhos que se renovam no brilho das estrelas e na força e imensidão do mar...
Fragmentos “salteados” do fértil jardim nerudiano em tempo de florescer a primavera permanente das ideias...
Que saibamos ver que a saída para uma nova ordem civilizatória está gravada na pedra e na existência de cada um de nós...em nenhum lugar mais.
Que possamos apreciar a criatividade e a força da vida e dos sonhos que se renovam no brilho das estrelas e na força e imensidão do mar...
Fragmentos “salteados” do fértil jardim nerudiano em tempo de florescer a primavera permanente das ideias...
Que texto maravilhoso!Me emocionei,e vou ler muitas vezes,PARA QUE FIQUE GRAVADO na minha memória!!!Precisamos mergulhar e voltar à tona sempre com a esperança de PODER MUDAR.Que DEUS ABENÇOE SEMPRE TEU CAMINHO MÁRCIO!!
ResponderExcluirA possibilidade de ler um texto, sucinto e inteligentemente construído, nos traz no mínimo um significativo bem estar.
ResponderExcluirÈ interessante, encontrar um conteúdo reportado ao compromisso de falar não unicamente da poesia de Neruda, mas essencialmente manter uma inter-relação com nossa “latinidad”. “Latinidad” por vezes negada por nós que também pertencemos a “esta” América Latina, rica em verso e prosa, e construída com muita história e pertencimento.
Parabéns pelo trabalho, dileto amigo... continue teus escritos, tão adoráveis e enriquecedores, sem perder o lirismo, que tem sido a essência dos latinos.
Parabéns pelo Blog.
ResponderExcluirAchei o texto lindo!!Boas palavras tornam a vida leve e repleta de entusiasmo.
Obrigada por nos ofertar belas e sábias palavras.
Mariana
Como estudante de Língua Espanhola,achei de muito bom gosto a paráfrase dos versos nerudianos,pois,nos traz valores que estão adormecidos pelo capitalismo selvagem e exacerbado.parabéns por tão sábias e humildes palavras.
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