domingo, 16 de janeiro de 2011


Rio”40 graus”... chuva, habitação, meio ambiente, exploração imobiliária e caos

“Posso sair daqui pra me organizar. Posso sair daqui pra me desorganizar (...) Quanto mais miséria tem, mais urubu ameaça (...) Que eu me organizando posso me organizar. Que eu desorganizando posso me desorganizar”. (Chico Science & Nação Zumbi)

1. Só mesmo um bizarro desenho de sociedade destituída de mínima solidariedade e alteridade para ensejar uma ausência de reação mais humana e efetiva sobre o caos das chuvas e enchentes na região serrana do Rio de Janeiro. Já são metros e metros de lama, mais de 500 mortos num ano de 2011 que começa mal.

2. A exploração sensacionalista que a imprensa faz do episódio é tão rasteira como os argumentos e justificativas das ditas autoridades constituídas. O pesar e a dor das mortes é proporcional à desinformação e falta de massa crítica produzida pelos “gigantes” dos meios de comunicação, que preferem, sempre, seguir a lógica de “mais” alienação do mesmo.

3. Desabrigados, desalojados, desassistidos do Estado, de ação social, de quase tudo...gente pobre,como sempre, fora do alcance do Estado Social. E, apesar disso, tudo o que quer se falar são remoções, quando na verdade faltou (e falta) orçamento e políticas pública de planejamento, de prevenção, de urbanismo. Triste retrato.

4. Momentos como esse nos mostram o quão frágeis e desaparelhadas são as instituições e a própria democracia... A defesa civil, por exemplo, continua sendo ilustre desconhecida na maioria dos Municípios e Estados brasileiros...População que parece deixar de atentar para a necessidade de estabelecer cobrança efetiva dos seus direitos, o que inclui participação popular na fiscalização da gestão pública...

5. Déficit habitacional, falta de moradia digna e, pior de tudo, tentativa de se aproveitar tragédia e desgraça alheia para fazer e promover “choques” de “ordem”ou mesmo fomentar a especulação imobiliária..perigo mais do que à vista..especialmente para quem interessa que tudo esteja, cada vez mais, fora do lugar...afinal, como já dizia Chico Science, “quanto mais miséria tem, mais urubu ameaça”....

6. Meio ambiente devastado que, cada vez mais, vai dando sinais visíveis de saturação, mesmo aqui na terra do “tupy or not tupy”, onde, apesar de tudo, até então, ainda nos achamos “abençoados por Deus e bonitos por natureza”....não se sabe até quando...

7. Para tomar um problema “concreto” atual sem perder o paralelo da realidade cotejada com a arte, se é verdade que “de adversidade vivemos” (Helio Oiticica), o começo de ano com um problema desses pode ser tempo de repensar como e para onde vamos..difícil saber “quem é marginal e quem é herói”. Algum motivo “para além da natureza” (chuvas em 24 horas equivalentes ao percentual de um mês) há de ter para que as chuvas torrenciais recentes tenham produzido muito mais vítimas no Brasil e na Colômbia do que na Austrália...

8. Governos, negócios e tragédias, não por acaso, são situações associadas. Ninguém fala ou quer saber de urbanização e de planejamento urbano. Drenagem e contenção, quem sabe, só se for para o próximo “Pan”, para a “Copa” ou para “Olimpíadas”....Para este tipo de evento, não raras vezes permeado de superfaturamento e corrupção, dinheiro corre como rio..nunca falta...que o diga a “reforma” do Maracanã, uso de recursos públicos para beneficiar assentos e camarotes privilegiados para exploração comercial da Fifa...

9. Virada a página no calendário, muita coisa não muda...planeta com sinais visíveis de esgotamento, falta de políticas públicas e deficiente mobilização e pressão popular para verdadeiras e reais transformações.

10. É preciso parar e refletir sobre a tragédia do Rio, sem prejuízo de que a caminhada deva continuar, ainda que sob novo rumo, sob pena de novos lutos...

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