domingo, 9 de outubro de 2011

O petróleo cada vez menos nosso...


“Toquem o meu coração. Façam a revolução. Que está no ar. Nas ondas do rádio. No submundo repousa o repúdio. E deve despertar” (Rádio Pirata – RPM)

1. Mais uma vez irritante, covarde e entreguista a postura adotada pela grande mídia nacional, o que bem se evidencia na forma parcial e pobre como os jornalões tem explorado (ou não tem examinado sob ângulo mais plural e aberto) a questão do petróleo, pré-sal e royalties.

2. Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo e os outros 06 (seis) Estados produtores possuem todo (e natural) direito de reinvidicarem o que entendem merecer, no caso, parcela diferenciada na distribuição dos royalties. Ainda que a exploração de recursos naturais dispostos nos território desses entes federativos mereça uma justa compensação, não resta dúvida de que esta partilha deve ser feita em padrão muito diferente do método atual (apenas 20% para União e 80% para Estado produtor), a não ser que se queira, como muitos, deixar como promessa vazia permanente o fato da nossa República ter estabelecido como seus objetivos fundamentais a construção de uma sociedade justa e solidária, compromissada com o desenvolvimento nacional e com a erradicação da pobreza e marginalização, com a redução das desigualdades sociais e regionais.

3. Por mais que os critérios de divisão de royalties constituam tema de indiscutível relevância e proveito interno para definir os rumos do particularmente desigual federalismo brasileiro, não é preciso ser exacerbado nacionalista para perceber que o maior perigo continua vindo de fora e do estrangeiro.

4. O principal problema em relação ao qual a mídia cala e omite (e a cidadania, por consequência, até aqui se cala), diz respeito ao fato de o Governo brasileiro continuar insistindo na realização dos “leilões” das bacias de petróleo, prática que faz a farra e enche o bolso de investidores e conglomerados financeiros não só nacionais, mas sobretudo estrangeiros, (neo) “piratas” não combatidos, característicos pelo “telhado de vidro” e “cara de pau”, predicados que não raro revestem a arquitetura pessoal e moral de muitos membros do Estado e da estrutura de poder no Brasil.

5. Se parte significativa da nossa boa história tem na criação da Petrobrás no Governo de Getúlio Vargas um dos seus marcos mais valiosos, o primeiro grande ato de “assalto” ao petróleo brasileiro começou pelas mãos torpes do Governo Fernando Henrique Cardoso (1994/2002), através da Emenda Constitucional n. 09/95, que, ao alterar o artigo 177 da Constituição, permitindo regime de permissão para “a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio” sobre o petróleo, quebrou a espinha de uma expressão de monopólio estratégica e decisiva para o futuro de nosso país, o que ganha ainda mais expressão de prejuízo a partir das recentes descobertas do campo do pré-sal. Ah, com um Executivo desses para “defender o interesse nacional”, que mais precisamos?

5. O segundo ato, por sua vez, diz respeito à edição da nefasta Lei do Petróleo (9.478/97), monumento à lógica colonial e tosca que governantes brasileiros, em tempos de república e democracia forjada no papel, não raras vezes ilegitimamente proporcionam ao povo. Ponto para o Legislativo brasileiro. Ah, com um Legislativo desses (....).

6. O terceiro ato foi complementado pelo Supremo Tribunal Federal que, com a mesma capa togada que recentemente reconheceu a anistia oficial a torturadores (a pior absolvição já proporcionada pela justiça brasileira), também fez a pior interpretação possível da matéria em sede de controle concentrado de constitucionalidade, com todo o estrago inexorável de quem decide (e erra) por último” no Estado Constitucional. Ponto para o Judiciário brasileiro. Ah, com uma Corte Suprema dessa (...).

7. Não se trata aqui de defender um nacionalismo exacerbado, distorcido e sem motivo, mas simplesmente de entender que o Brasil, como nação soberana que é (ou deveria ser), precisa(ria) ver na exploração dos recursos naturais, quando inevitável e possível, pelo menos um caminho para proporcionar um projeto um pouco mais emancipatório para a sociedade brasileira, tudo o que não acontece.

8. Discute-se sobre como dividir internamente os royalties, mas essa temática é um pequeno ponto "negro" e "escuro" (como o petróleo) dentro de um contexto (e oceano) muito maior, pois a “grande discussão”, que censuravelmente não está sendo feita, diz respeito aos critérios que devem orientar o novo marco legal-regulatório, pois só este poderá limitar nova latitude e longitude para mudar o comportamento até aqui nocivo e brutalmente predatório do Estado brasileiro na gestão de nada menos do que o produto (combustível) mais estratégico no motor economia mundial.

9. Leiloar bacias de petróleo, da forma como tem sido irresponsavelmente feito, implica numa venda da propriedade pelo pior preço e condição possível. Se alienar ou mesmo exportar petróleo pelo Estado já seria um tanto quanto discutível (especialmente quando estadunidenses e europeus adotam política contrária inversa, preocupada, inteligentemente, na preservação de suas preciosas “reservas”), imagine-se o quão destrutivo e nocivo pode ser para o interesse público primário nacional simplesmente permitir que façam, da nossa riqueza mineral, o novo pau-brasil, a nova cana de açúcar, o novo "vale-exploração" em tempos de globalização neoliberal. Que o diga a nossa maldita cultura de eterna colônia que, apesar de não ser "ilha", continua a nos cercar e prender por todos os lados! E olha que nesse mar tudo o que não falta são "tubarões"....

10. A matilha dos lobbystas e o alto comissariado do Ministério de Minas e Energia somente contribuem para piorar este quadro de caos, o que bem se demonstra pela composição da grade horária das “audiências públicas” realizadas no Parlamento, verdadeiro teatro cínico no qual, com privilégio de tempo e espaço, assiste-se o desfile da advocacia de múltiplos interesses divorciados do nosso futuro enquanto país. Veio o alerta “Wikileaks” demonstrando e expondo correspondências entre o Consulado dos EUA no Rio de Janeiro e o Departamento de Estado, evidências simbólicas do interesse e da sede “alien-estrangeira” na exploração desmedida do pré-sal e, mesmo assim, absolutamente nada mudou...

11. O monopólio do petróleo precisa ser retomado. Esse o norte inicial de uma discussão e luta a ser permanentemente travado na defesa do melhor interesse nacional, do nosso interesse público primário.

12. Mesmo frente à manutenção da situação atual, na pior das hipóteses, que pelo menos se considere a necessidade de se estabelecer pesada e onerosa tributação no que houver de petróleo aqui produzido, exportado ou comercializado pela iniciativa privada. Ou alguém desconhece a realidade social brasileira e o quanto esses rendimentos podem constituir em diferencial para alimentar o fundo nacional de combate à pobreza, nossa última e sectagésima sexta emenda constitucional?

13. De outro lado, enquanto o pequeno agricultor acampado ou assentado pena para receber migalhas (quando recebe alguma coisa), é igualmente inaceitável que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) disponibilize linha de crédito e dinheiro cada vez mais fácil e rápido para que grandes grupos investidores venham aqui “invadir, pilhar, tomar o que nosso”, degradando nossos recursos naturais, seja barrando rios, seja fazendo exploração nefasta de nossa riqueza mineral ou qualquer coisa que o valha.

14. É revoltante pensar que nacionais e, sobretudo, estrangeiros, não só possam explorar petróleo em solo brasileiro sem nenhum tipo de álea ou risco como, ainda assim, compensarem os royalties a serem pagos com a sua produção, absurdo dos absurdos que o Senador Pedro Simon tentou bravamente impedir.

15. Que não só a AEPET (Associação dos Engenheiros da Petrobrás), o Senador Pedro Simon e outros poucos abnegados possam discutir esse problema, mas sim o movimento estudantil, os movimentos sociais e, de modo geral, a sociedade brasileira, um tanto quanto desinformada e alienada no tocante a um assunto que pode mudar, um pouco, o prognóstico da nossa situação enquanto país e enquanto nação. Ou alguém duvida que ainda são muitas promessas e compromissos pendentes da nossa Constituição cidadã que (sem alarde) comemorou seu vigésimo terceiro aniversário no último 05 de outubro?

16. Ou a sociedade se mobiliza e o quadro poderá ser mitigado, quando não propriamente revertido ou, no que depender do atual estado das coisas dos poderes de Estado Brasileiro, melhor deixar a porta aberta para o ladrão pirata continuar tirando daqui o que quiser e como bem entender, e isso sem praticamente deixar nada em troca, numa verdadeira "ilegalidade democrática", quando não um maldito bonapartismo tupiniquim, permanente "estado de exceção" (Agamben).

14. Será que o petróleo ainda pode realmente tornar a ser nosso? Que toquem os corações..que se façam as revoluções....


OBS: Créditos e agradecimentos especiais ao apresentador Paulo Passarinho e produção do Programa Faixa Livre (www.faixalivre.org.br), espaços diferenciado na imprensa brasileira que tem contribuído permanentemente para qualificar a discussão sobre esse problema.

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