quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Encontro em "Mont Pellerin"



Certa feita, em abril de 1947 (pós II-Guerra Mundial), alguns intelectuais reuniram-se na pequena localidade Suiça de "Mont Pellerin".


Entre eles estavam o falecido economista estadunidense MILTON FRIEDMANN e o igualmente póstumo filósofo alemão KARL POPPER.


Depois de 10 dias de "reflexão", o seleto grupo deliberou e entendeu que a sociedade da época estava em "perigo" e sob "ameaça" constante de tendências políticas subversivas e contrárias à boa ordenação social.


O mundo comunista e socialista, para eles, era a expressão pura do inferno, do inimigo e do "terror" que precisava ser combatido com tenacidade.


O mencionado grupo, de maneira geral, dentre suas conclusões, entendia que o "mercado" era o único e legítimo sujeito da história, a base de todos os direitos, direitos humanos, inclusive. Eles acreditavam no delírio e estupidez de que o sagrado "mercado" era mais democrático que a própria democracia.



FRIEDMANN, na sua obra "Capitalismo e Liberdade (1972)", posteriormente premiado com "Nobel da Economia" (1976), chegou a pregar a redução do Estado em todos os campos, menos no segmento militar e policial, afinal, segundo ele, algumas instituições tinham que defender a liberdade dos inimigos internos e externos que ousavam se opor ao idealizado sistema de império do capital. Em seus estudos, FRIEDMANN chegou ao ponto de dizer que o mercado era melhor do que a democracia, pois no mercado, por exemplo, num grupo de 11, se 6 querem comprar gravatas verdes e 5 desejam adquirir gravatas vermelhas , é possível cada qual comprar a cor de gravata que "livremente" quiser; já na democracia, tolice, sempre haverá de prevalecer a vontade da maioria...


O filósofo KARL POPPER, por sua vez, abria "fogo cruzado" contra os pensadores classificados como "historicistas" ao entender que todos aqueles que viam um propósito na história, que apostavam na necessidade de continuar sonhando com uma utopia concreta capaz de proporcionar mudanças em prol de um mundo melhor e mais justo nada mais eram do que uma tola sociedade tribal. Para ele, somente o mercado poderia ser louvado. Curioso notar que o mesmo POPPER, em sua proposta filosófica, entendia que a ciência somente avançava e progredia na verdade a partir de "dedução"; ele, no seu "falsificacionismo" entendia que todas as teorias ainda a serem falsificadas eram boas, pois, segundo ele, somente poderia falar da realidade algo que fosse, em si, "falsificável"; se algo não tivesse a qualidade de "falsificável" certamente não poderia pertencer à realidade.


Não por acaso essas "brilhantes" idéias surgidas em "Mont Pellerin" serviram de "pasta-base" para alimentar as tristes, cruéis e perversas ditaduras que tomaram corpo na América Latina nos anos 60 e 70 sob forte estímulo e batuta do "Tio Sam" estadunidense (sempre ele...).


As mesmas teorias são "papagaiadas" até hoje...


A propósito, o historiador chileno MIGUEL ROJAS MIX é taxativo ao afirmar que os pressupostos ideológicos do cristianismo e do predomínio da idéia civilizatória do "ocidente" foram decisivos no contexto e na implementação dos Estados Ditatoriais, inclusive na sangrenta ditadura do seu país (derrubada de "Salvador Allende" em 1973).


Sendo FRIEDMANN e POPPER legítimos participantes do colóquio de "Mont Pellerin" a "antítese" de suas teorias não pode passar incólume.


Afinal, na sua teoria de glorificação do capital, esqueceu FRIEDMANN de explicar que a alucinante e orgásmica auto-regulação do mercado nada resolveria para quem não tinha como "consumir" ou "comprar" nada, para quem não precisava de gravatas, mas de sim de prato de comida, moradia e serviços públicos essenciais (saúde e educação). Aliás, em tempos de "grande crise" e de "necessidade de intervenção estatal" na economia, como vivemos hoje, o que será que o "sábio" economista estadunidense nos diria?


POPPER, por sua vez, no seu ódio contra a história e a utopia, talvez tivesse na falência do monólogo neoliberal a maior prova da sua tese "falsificacionista", que infelizmente existe e ainda está perigosamente (esta sim) incrustada na realidade...


Não por acaso o Fórum de DAVOS continua nas cercanias dos Alpes Suiços...


Não por acaso, alguns teimosos historicistas reunidos em BELÉM do Pará continuam acreditando que "outro mundo melhor e progressivamente mais justo" é possível.


Não por acaso, a "política externa" estadunidense, além de ditaduras, na lógica sádica do capital, continua produzindo míséria e uma sucessão de guerras...Que digam os iraquianos e as recentes vítimas do "massacre" palestino...


Contraditoriamente, a mesma proposta estadunidense de combater o "inimigo" comunista de ontem criou o "terrorista-muçulmano" de hoje.


Na grande mídia, entre o 11 de setembro de 1973 no Chile que derrubou Salvador Alende e o 11 de setembro de 2001 no episódio das "torres gêmeas", qual data merece mais espaço?


Qualquer semelhança certamente não será mera coincidência...


Afinal, de que lado está o verdadeiro "terror"?


Herança de "Mont Pellerin"...



2 comentários:

  1. Ainda hoje lia no jornal Le Monde Diplomatique Brasil a necessidade de utopias...aqui no blog encontrei um texto que completou o que eu lia de forma brilhante! Ainda me ajuda a ter argumentos que muitas vezes me faltam, mas que sinto de alguma forma, para os que acreditam que o sistema que vivemos não precisa ser alterado e que dessa forma vamos bem! Mas ainda chego la, afinal sou ainda um vestibulando, por enquanto vou espiando e aprendendo aqui no blog!

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  2. Concordo plenamente. E ainda incluiria Hayek na crítica. O guro do giro epistêmico meios-fins. Também discuto questões conexas. Estou no juliomarcellino.blogspot.com. Vamos ampliar, se possível, o debate sobre as tormentosas relações entre Direito, Economia e Política. Abs e parabéns pelo Blog.

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