sexta-feira, 19 de junho de 2009

A “farra” do petróleo: até quando?


Petróleo é produto estratégico, recurso natural finito, instrumento de exercício da soberania que, vale lembrar, é o primeiro valor e fundamento da República, conforme artigo 1º, I, da Constituição. Este mesmo petróleo que, a rigor, deveria constituir efetivo monopólio da União (artigo 20, da CR), talvez seja o mais significativo lastro econômico mundial na atualidade, a reserva que potencializa e dinamiza a possibilidade de desenvolvimento interno das nações mediante garantia de abastecimento energético.

Apesar disso, longe vai a consciência dos governantes, distante parece estar a preocupação do povo brasileiro com os efeitos terríveis das predatórias políticas do petróleo ativamente iniciadas durante o trágico Governo FHC e mantidas na era LULA sob o plano da omissão e ausência de reversão.
A não ser que se queira louvar premissas neocoloniais violadoras da soberania, constitui fato absurdo, quando não propriamente revoltante, saber que na história recente deste país, à revelia da conscientização e mobilização popular, sem que haja esclarecimento suficiente do tema de parte da quase sempre omissa mídia de banda larga, continue-se dando seguimento à mercantilização e alienação vil de nossas preciosas bacias de petróleo, situação grotesca que tem permitido que empresas estrangeiras venham explorar um produto que, por sua natureza, é estratégico sob o ponto de vista energético, econômico e social, particularmente porque o petróleo é produto mundialmente escasso e de ainda grande e quase irracional utilização e consumo...
Pior do que isso só mesmo descobrir que o resultado tributário e a “compensação financeira” que reverte para o Brasil é irrisória, beira a bagatela, tanto que não chega à metade da média internacional (acima de 80%), vale dizer, “eles” continuam nos dando espelhos, como se “índios” todos e tolos ainda fossemos. Igualmente angustiante é perceber que a população ainda não está vendo e percebendo a “doença” e nocividade desta perversa política privatista do interesse nacional. Em verdade, a constatação lamentável é que o pau-brasil, o açúcar, o ouro e os minérios “de ontem” hoje foram substituído pelo petróleo, produto que faz e alimenta e “farra” do capital na ausência de marcos regulatórios efetivos, na ausência de exercício de cidadania e no flagrante desrespeito da soberania como fundamento da República.
Basta assistir poucas cenas da imprensa internacional para perceber o quanto “eles” (especialmente os brothers ricos estadunidenses) preocupam-se com o tema (outro dia, para que se tenha uma idéia, a "enquete do dia" na rede CNN era justamente a discussão sobre o preço do barril de petróleo e o futuro). Ao contrário, nós, brasileiros, continuamos explorados, alienados e, mais grave de tudo, ainda sem consciência e mínima força de mobilização sobre o verdadeiro crime de responsabilidade e atentando contra a soberania nacional que está sendo cometido. Enquanto os “outros” ditos desenvolvidos, espertamente, mantém intangível e preservadas suas “reservas” de petróleo, nossos governantes continuam permitindo a devastação e exploração desmedida de nossas riquezas naturais na pior lógica do extravismo que aniquila perspectiva de um novo projeto de nação (que dizer da recente privatização das florestas?).

Apesar disso, infelizmente a imprensa, de modo geral, prefere ficar explorando detalhes e mais detalhes destroços de um trágico e pontual acidente aéreo para atração mórbida da patuléia ao invés de explorar e desenvolver uma leitura mais pedagógica e, sobretudo, cívica do tema do petróleo. Tudo é uma questão de consciência, de qualidade e controle da informação e, claro, de servir ao interesse (de classe, obviamente), de prestar contas a quem patrocina e financia toda esta “festa pobre” de um Brasil que ainda não mostra a sua cara, embora seja fácil saber e identificar “quem paga para a gente ficar assim”, como bem já afirmava a crítica emancipatória e reflexiva do saudoso músico-poeta CAZUZA.

Nesse contexto, que dizer da famigerada Lei 9.478/97? Que dizer da omissão e dos equívocos do STF, nossa Corte Constitucional, quando do controle de constitucionalidade by “jogo de palavras” feito na ADI 3.273 e 3.366, de Relatoria do Ministro EROS GRAU? Que dizer da falta de posição e postura do Ministério de Minas e Energia comandando pelo Senhor Ministro EDSON LOBÃO apesar de todo o seu histórico? Que dizer do papel pífio que está sendo exercido pela ANP – Agência Natural do Petróleo, Gás natural e biocombustíveis? Que dizer da nossa postura enquanto sociedade para este fato? Será que não está na hora de buscarmos e cobrarmos um novo marco regulatório para este relevante setor? O que estamos esperando para a saída às ruas, cadê a força de mobilização popular? A explicação, certamente, passa por educação (de novo e sempre ela), exercício de cidadania...

Afinal de contas, petróleo deveria ser efetivo monopólio da União, nos termos do artigo 177 “caput” da Constituição e seus incisos, nos termos da redação original do parágrafo primeiro, que bem dizia e garantia ser “vedado à União ceder ou conceder qualquer tipo de participação, em espécie ou em valor, na exploração de jazidas de petróleo ou gás natural”, redação substituída pela lógica neoliberal da nefasta Emenda Constitucional n. 09/1995, a partir da qual se estabeleceu que “A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos artigos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei”.
Mais um caso de “retalhamento” da Constituição via poder constituinte reformador que mostra seus perversos efeitos (inclusive de inconstitucionalidade), mais um caso em que o interesse econômico está mostrando que ainda vivemos numa nação lamentavelmente “sem fronteiras” para a exploração, na marginalidade do interesse das metrópoles estrangeiras e dos grandes conglomerados econômicos.

Certo é que alguma coisa precisa ser urgentemente feita. O povo precisa ser informado e a mobilização enérgica da sociedade civil pode ser um caminho importante e marxiano de pressão transformadora da realidade, afinal, se dependermos e esperarmos que o Legislativo fiscalize a defesa do interesse nacional e da soberania, o máximo que podemos obter é a divulgação de relatórios e publicações “secretas” antidemocráticas e ímprobas que remontam ao tempo da “inquisição”, quiçá do império, mostrando e expondo os cancros do que talvez, pelos sucessivos escândalos, seja uma das piores e, porque não, mais “canalhas” legislaturas da história...Que possamos lembrar um pouco disso em 2010...

Lembremos, afinal, que, pelo menos nos termos da Constituição, no parágrafo único do seu artigo primeiro, todo poder emana do povo, por mais que o problema talvez esteja na delegação de parte do exercício destes aos tais “representantes eleitos” que, desde há muito, numa reforma política esperada (que verdadeiramente nunca chega), estes sim é que precisam ser chamados “às falas” quando descumprem defesa dos interesses da nação, mais ou menos como numa espécie de “recall”, direito do consumidor para produtos viciados...

Certo é que, em nome da soberania nacional, a vergonhosa e humilhante “farra” do petróleo precisa acabar, pois neste tema, infelizmente, parece que ainda não viramos a página histórica da maldita e nefasta exploração colonial...Mas, como diz o hino nacional, quem sabe a coisa um dia muda, afinal, de amor e esperança é que se vive e nesse céu risonho e límpido ainda há de sobrar espaço para alternativas de crítica e verdadeira transformação social, fundamento do Estado Democrático de Direito que ainda hiberna no desejo de uma bem intencionada, porém infelizmente descumprida Constituição, lei maior do país.

Um comentário:

  1. é...trata-se da cegueira epidêmica de que falava Saramago..."os que vêem mas não enxergam...". Lamentável. Ab. Julio Marcellino.

    ResponderExcluir

Dê a sua tesourada, faça o seu comentário: