domingo, 24 de março de 2013

A democratização dos meios de comunicação social (censura é o monopólio que temos hoje).



Chegou o momento de conciliarmos a liberdade de comunicação (artigo 5o, IX, da Constituição) com a garantia de que os meios de comunicação sejam, de fato, sociais. Está na hora.

A comunicação social não pode ser mais um capítulo perdido no meio da Constituição (artigos 220 a 225) e precisa ser discutida pelo povo.

Premissas equivocadas devem ser derrubadas.

Controle para que os meios sejam de fatos sociais não é a “restrição” constitucionalmente vedada.

Permitir monopólios privados também é uma forma diferenciada e perversa de censura, até mesmo porque, segundo o parágrafo quinto do artigo 220 da Constituição, “os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio”.

Tomemos o exemplo da “telinha”. A televisão está em 96,9% dos domicílios, sendo de longe o meio de comunicação mais difundido e utilizado. O mais curioso é que neste bendito meio qualquer propaganda de informação e utilidade pública que não seja a garantida pelo horário político-eleitoral tem que ser paga (e bem caro) para ser veiculada.

Por que o Poder Executivo não muda isso? Simples. Porque as vezes é o próprio Governo que capitaliza lucro eleitoral com esse sistema. Para ficar num exemplo concreto, é por essas e outras que ao invés de se esclarecer que o SUS (Sistema Único de Saúde) é gratuito e que a assistência farmacêutica é um direito de todo o cidadão, conforme prevê o artigo 6o da Lei 8.080/90, o Governo, no caso o Federal, prefere pagar propagandas nos mais diversos e grandes jornalões  "vendendo" a ideia de que remédio de graça é "favor" da Presidenta. Barbaridade.

Se existem princípios para que as programações de rádio e televisão observem, pergunto: quais são as finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas (quem diz é o inciso I do artigo 221) que temos na televisão aberta e pública nos dias de hoje?  Alguém acha que os meios fazem uma difusão adequada da cultura nacional e regional (inciso II do artigo 221)? A regionalização é observada (inciso III do artigo 221)? Quem se arrisca a atravessar a programação com foco nessas questões?

De nada adianta a restrição de propriedade de meios a brasileiros natos e naturalizados com mais de dez anos ou a pessoas jurídicas constituídas no Brasil, condicionantes para edição e seleção da programação se, na prática, isso não tem nenhum resultado prático e pode ser burlado pela permissividade com o setor.

Lembrando que cabe ao Poder Executivo tratar das concessões, permissões e autorizações para o serviço de radiodifusão, devendo o Congresso Nacional apreciar o ato.

A propósito, alguém sabe dizer quais casos em que não houve a renovação de concessão ou permissão que já ocorreu pelo Congresso Nacional (artigo 223, parágrafo segundo, da Constituição), possibilidade prevista pelo artigo 223, parágrafo segundo?

Já houve alguma decisão judicial determinando cancelamento de alguma concessão? (artigo 223, parágrafo quarto)

E o que dizer, então, do Conselho de Comunicação previsto como órgão auxiliar do Congresso Nacional, na forma do artigo 224, funciona? Quem são seus membros? O que discutem? Cadê as atas? Onde está, aqui, no campo da mídia, a democracia participativo-deliberativa como princípio? Ou será que a preocupação com uma Conferência de Comunicação que busque transformá-la será correr os mesmos riscos do Governo Argentino de Cristina Kirchner, sempre tachada (como ocorria com Chávez) como “inimigo” da imprensa?

Além de fazer justiça aos bons veículos que volta e meia cuidam do tema (Le Monde Diplomatique, Caros Amigos, Programa Faixa Livre, TV Cultura, Globonews – curiosamente esta última disponível apenas para assinantes e não para informar o povo), antes de emitirem editorais direcionais e preconceituosos pela mudança da ordem das coisas que ocorre em alguns países da América Latina, gostaria de ver os meios de comunicação no Brasil ocupados em fazer um debate sério sobre assunto.

O mundo complexo do direito, os juristas, também precisa pensar na efetividade desses dispositivos.

A comunicação precisa ser de fato social e não refém dos interesses do deus-mercado.

O espectador não é apenas consumidor, mas também cidadão, o que não interessa às grandes redes (e, verdade seja dita, também não interessa a muitos governos que, distantes da “potentia” do poder em si e próximos do fetiche autorreferencial do “potestas” como poder delegado estão geograficamente longe da política como ofício que, como bem ressalta Dussel, deve ser um ofício nobre e patriótico).

Na imprensa brasileira, de modo geral, especificamente na televisão, como bem afirma com lucidez Silvio Caccia Brava, “não há análises de contexto, os fatos não se inscrevem em lógicas mais amplas. [...] os meios de comunicação vivem uma relação promíscua com o poder político e o poder econômico [...] Basta ver quem detém as concessões, por exemplo, das estações retransmissoras das principais redes televisivas, distribuídas, em grande parte, para as oligarquias e lideranças políticas regionais. Seu objetivo não é mais servidor à sociedade, mas se servir dela para alavancar interesses privados, para alavancar negócios, para reproduzir as elites no poder”.

É por isso que as discussões não avançam. É por isso que após a escolha do papa volta-se a curiosidades fúteis, sem que a Igreja Católica como instituição seja discutida, com respeito a visão do ocidente e do oriente, com respeito à liberdade, com a indicação sistematizada dos fatos, da inquisição à teologia da libertação; é por isso que os noticiários dos crimes de trânsito episódicos não revertem numa discussão série sobre a necessidade da legislação ser revista, sobre a necessidade de se discutir a municipalização na fiscalização do trânsito na maior parte das cidades brasileiras, sendo mais fácil divulgar a tragédia do episódio;  o mesmo vale para as matérias que se ocupam da água apenas no seu dia mundial, esquecendo a poluição hídrica fomentada pelo próprio Estado, as agruras da nefasta transposição do Rio São Francisco, a burrice que é produzir energia com a morte da vida em diversos rios quando existem outros canais alternativos; isso vale também para o jornalismo que prefere explorar a “espetacularização” dos julgamentos concretos sem discutir a total falta de prioridade do Poder Judiciário brasileiro para priorizar o processamento e o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, que na periferia brasileira são julgados por vezes 10 ou 15 anos depois do fato realizado, sobre o que pouco ou nada se diz em tempo em que a “justiça” chega nos aeroportos; é por isso que a discussão do IDH não resiste a duas ou três manchetes e resvala para a exploração política ao invés de discutir o tema com profundidade e de modo responsável.

Os discursos da mídia são tanto inofensivos como perigosos. Inofensivos porque não permitem que nada se transforme; perigosos porque distorcem e não raras vezes desinformam.

Tudo se resume em divulgar as pesquisas dos institutos, “ibopetizar” e “datafolhar” as coisas, desde a avaliação do governo, das instituições, dos direitos...Não por acaso existem tantas visões distorcidas e equivocadas.

Nesse quadro, a comunicação digital ainda é o que temos de melhor, mais horizontal e democrático...

Ninguém aguenta mais tanto jornalismo "canalha" (José Arbex Junior).

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Pietà: obra-prima de Kim Ki-Duk





Apesar do nome, não se trata de um filme sobre a arte de Michelangelo, mas a história bem tramada é capaz de comover e sensibilizar. O roteiro impressiona.
O cenário é o distrito de Cheonggyecheon, arrabalde de Seul, local de industrialização crescente numa Coréia do Sul contrastada pelos arranha-céus e devastada por uma pobreza comovente.
Num prédio antigo, quase abandonado, vive um cobrador de dívidas de agiotagem  desprovido de qualquer sentimento de humanidade, particularmente perverso. Seu ofício é trabalho dos mais sujos e repetitivos. Seu nome é Lee Kang-do. Todo dia ele desperta para caçar de forma cruel e impiedosa todos os devedores. Direta ou indiretamente a cobrança proporciona mutilações sangrentas para pagamento de prêmios dos seguros, única forma do trabalhador quitar seu débito com o sistema e seus altíssimos juros. A máquina que um dia deu o sustento já não serve para sobreviver, mas para mutilar. Aqui os “acidentes” do trabalho são a única saída para pagar o que se deve ou, quem sabe, a expectativa para criar um filho. A que ponto chega o desespero da miséria canibal-capitalista.
Inveja de quem foi abandonado, de quem nunca teve mãe. Resultado: distúrbios de toda ordem, inclusive sexuais. Na desumanidade sempre há um tanto de desamor, faz sentido.
Até que um dia esse cobrador descobre uma mulher que se apresenta como sua mãe que o abandonou desde criança e que se diz disposta a pedir desculpa e a se redimir.  Reencontro de ódio, drama e amor.
O que começa como dúvida logo se dissipa por algumas provas de alguém que, mesmo na maldade que parece nata de Lee Kang-Do,  acima de tudo quer acreditar que não está sozinho. É a partir disso que seu personagem, aos poucos, aprende a enxergar o que é alteridade.
Gradualmente a vida solitária de Lee Kang-Do começa a mudar no caminho do remorso e da redenção.A notícia do primeiro aniversário, a busca de informações pela história, os primeiros sorrisos, a infância de quem não teve.  Aparecem os traços do humano. Eis a chance e oportunidade.
Contudo, o preço do passado atormenta. Nada pior do que ver seu familiar perseguido, maltratado, ameaçado...Agora Lee-Kang-Do adquire consciência das múltiplas maldades que já fez. Suas vítimas rondam sua existência como fantasmas e passam a ameaçá-lo. Na roda da vida a vingança chega à vida de Lee Kang-Do, também recheada dos mesmos juros exorbitantes. Conviver com o ódio e a ira das muitas famílias destruídas do que um dia pensou ser uma profissão, eis o empréstimo a ser quitado.
Na tela já estão todos os ingredientes para uma reflexão caleidoscópica. Do que é capaz uma mãe que tem que conviver com a perda do filho nos braços;  que desumanidades podem advir do abandono de um filho e, sobretudo, como o dinheiro pode destruir as relações humanas.
A importância da família e do amor no processo de socialização.
A miséria humana gerada pelo capitalismo, pela preocupação do maldito dinheiro.
Abandono, solidão, crueldade, reencontro, amor e vingança.
Esses alguns elementos da história do extraordinário filme de Kim Ki-Duk.
Pietà (2012, 104min) mereceu, com sobras, o Leão de Ouro no Festival de Cinema de Veneza.
Pode chegar tranquilamente ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Vale a pena cada minuto de poltrona.
Para além de Psy, felizmente, a Coréia tem Kim Ki-Duk.


sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Pães, batatas e armas de fogo: alimentos de um sistema-mundo capitalista





Mais uma chacina recente ocorrida em escola estadunidense de Sandy Hook, em Newtown, (re) coloca em discussão a relação existente entre violência crimes e circulação de armas de fogo.

As tragédias de morte com uso de arma de fogo  se sucedem em histórico preocupante tendo como palco predominante escolas,  agências de socialização como as famílias para aquisição de modos, costumes e recursos para melhor convívio em sociedade.

O Massacre de Columbine, registrado com maestria na lente do Diretor Michael Moore, ocorreu em 1999 e dali para diante nada mudou.

Assim como, apesar da ignorância (ingênua e feliz) de muitos,  lamentavelmente  vivemos numa narcodemocracia, - ou seja, as drogas integram o agir estatal, que diante delas só sabe reagir repressivamente e sempre por intermédio do uso banalizante do direito penal para auferir seus dividendos de capital, para atender a demanda de quem interessa um proibicionismo quase sem limites, - as armas também integram uma estrutura econômica de um capitalismo de mercado destrutivo e aniquilador.

Será mesmo novos tempos para uma nova política de controle de armas? Really new time for changes in gun control? I don’t think so.

É impressionante a capacidade da sociedade estadunidense encontrar motivos no cinema, na televisão e até mesmo (pasme-se) em jogos de vídeo-game para, diante de causas plurais e complexas, atribuir culpa de uma cultura nefasta doentia absolutamente armamentista não só predatória da natureza, mas ceifadora de vidas humanas em progressão geométrica.

Realmente não há como receber de outro modo a notícia risível de que certas autoridades estadunidenses passaram a defender a necessidade de segurança armada nas escolas e não propriamente a restrição drástica do critério de mercado que estimula e permite que haja compra e venda de drogas mais ou menos como ocorre com pães e batatas.

A solução é coerente, claro. Para resolver o problema do mercado, dê-se mais mercado.  Ao invés de se restringir os lucros e a “mais-valia” de quem fatura dinheiro às custas da eliminação em massa de vidas alheias por disseminação da violência, aproveita-se a oportunidade para aumentar ainda mais a sensação irrazoável e muitas vezes paranóica de insegurança (já bem alertada por Bauman) cuja demanda, evidente, movimenta uma economia cada vez mais ética e mais distante do paradigma da conservação e incremento da vida (para lembrar Dussel).

Do mesmo modo que pães e batatas  são alimentos que faltam a pobres e loucos de fome que somam mais de um bilhão de pessoas no mundo (que ainda um dia há de acabar por conta disso e não por crenças cosmogônicas ou teológicas infundadas e assimiladas com irritante espaço nos alienantes meios de comunicação social massivos), em verdade o comércio de armas e munições nos Estados Unidos (e daí para o mundo na guerra perdida do narcotráfico) nada mais é do que o alimento de um sistema-mundo doente por uma economia com apetite cada vez mais voraz de destruir subjetividades e projetos democráticos de um respeito efetivo ao paradigma de direitos humanos, que vai longe de algo puramente ocidental, democrático ou capitalista.


terça-feira, 25 de setembro de 2012

Movimento Casa Warat



"Nos une construir un mundo, donde cada uno sea un encuentro con los otros" (Luis Alberto Warat - II Encontro Internacional da Casa Warat, 2010) 


I - Uma casa potencialmente aberta, de muitas e acessíveis portas, composta de diversas e coloridas janelas, de arquitetura horizontal e propriedade coletiva tombada pela liberdade, surgida originariamente em território latino-americano, numa alfândega permanente entre a Argentina e o Brasil, com a possibilidade móvel e nômade de transportar-se e expandir-se para qualquer outro espaço ou atmosfera de afeto disposto a receber sua instalação e funcionamento em caráter permanente ou temporário.


II - Uma rede que pode ser integrada por estudantes de qualquer ramo do saber e por profissionais de qualquer atividade, capaz de prover quarto e cuidados a todos, teia de conhecimento na qual cada um precisa ter liberdade e autonomia para deixar sua contribuição, na certeza de que a ajuda no aprendizado solidário se dá a partir de uma premissa de respeito sensível ao outro e à reciprocidade como forma de abrigo.  

III - Um grupo de pessoas que, dentre tantos ideais e projetos, com ou sem as instituições, tem preocupações, metas e objetivos comuns propostos a  conhecer, refletir, divulgar, difundir, discutir e desenvolver o pensamento genial e fantástico do Professor Luis Alberto Warat, essência reflexivo-epistemológica capaz de ir muito além de expressivas quatro décadas de ensino ou significativas quase cinco dezenas de livros.

IV - Uma casa composta de muitos e diferentes cronópios e jardins, não só disposta a contribuir para o aprimoramento pessoal e intelectual das flores cultivadas por cada um de seus hóspedes nos seus encontros com os canteiros dos vizinhos-outros, mas com a firme perspectiva de propiciar intervenção positiva na realidade social de modo a fertilizar a terra e o solo da vida e da convivência humana, seja problematizando temas, categorias e conceitos propriamente waratianos, seja pela possibilidade de aplicação de principios, ideias e praticas waratianas para a percepção do novo, do imaginário, do que falta ser criado e do que sempre há por vir...

V - Um conjunto de pessoas agrupados e sensibilizados para discussão de temas e assuntos relacionados à humanidade, no qual o direito é apenas um instrumento dentre outros de uma mágica e surrealista caixa de ferramentas, tendo como foco o rigor crítico que há de pautar todas as formas de conhecimento e desbravamento tanto dos territórios conhecidos e desconhecidos da arte, da filosofia, da sociologia, da antropologia, da psicologia e de tantos outros dormitórios do saber transformador. 

VI - Uma casa que todos estão convidados a participar e conhecer para fomento da subjetividade autêntica, fonte permanente e eterno devir dos recortes críticos de tudo que há. 

Conheça o Movimento Casa Warat! 

Casa Warat São Paulo: http://casawaratsp.blogspot.com.br/

Casa Warat Goiás: http://casawaratgoias.blogspot.com.br/

Casa Warat Sul: em construção

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Nomeação de Ministro do STF: "vida de gado" marcado?




Aproxima-se período fértil à nomeação de novos Ministros para o Supremo Tribunal Federal. Um deles está deixando a Corte (Cezar Peluso) e outros dois irão se aposentar ainda neste ano de 2012 (Ayres Britto pela compulsória e Celso Mello, segundo se diz, por questões de saúde e opção, respectivamente).

Em tempo de democracia consolidada já passou da hora da sociedade brasileira participar de modo ativo desse processo.

A hipertrofia do Poder Executivo Federal não pode chegar ao ponto de o Congresso Nacional continuar deixando a desejar no cumprimento de um papel mais efetivo na sugestão e discussão dos melhores nomes, crítica que também pode ser feita às instituições do sistema de justiça.

Se a soberania, de fato, pertence ao povo, como afirma simbolicamente o artigo 1o, parágrafo único, da Constituição, de algum modo a sociedade precisa participar!

A universidade brasileira, celeiro de grandes juristas, também precisa despertar de modo mais efetivo para o problema. Até aqui os seus congregados associativos docentes e discentes, inclusive movimento estudantil, parecem dormentes e despreocupados com a questão, o que representa grande e inexplicável alienação.

Não resta dúvida de que o mecanismo de processamento e controle formal e material da escolha de Ministro do Supremo Tribunal Federal precisa ser urgentemente aprimorado e, nesse sentido, investigar modelos de direito comparado pode ser uma importante ferramenta para enriquecer este debate.

Que todas as forças vivas da sociedade possam exercer seu engajamento e intelectualidade orgânica para que tenhamos uma escolha feita entre os melhores nomes, observado o caráter nacional e a pluralidade da participação da universidade, das instituições e da própria sociedade, afinal, não é pressuposto para ser Ministro do STF ter sido advogado-geral da União, um dos “critérios” que, segundo se diz, poderá ser novamente adotado.

Antes que o temor se consume, é de se esperar que a comunidade jurídica esteja especialmente envolvida neste processo.

Do mesmo modo, tomara que os órgãos de comunicação social apostem na conveniência e responsabilidade da pauta para enfrentamento do tema.

Que possamos sonhar com um processo de escolha recheado de consultas e de audiências públicas, pois o infame formato atual precisa estar “gravido” de algum outro modelo (peço licença para usar a expressão de Eduardo Galeano imaginando que este, talvez, pudesse endossar a medida.

Afinal, escolher Ministro da Corte Suprema e do Tribunal Constitucional da nação não é algo para ser feito pela ótica da ideologia político-partidária, por indicações de ex-Ministros de Estado, empresários ou agentes políticos, mas sim pela preocupação vocacional e técnica que a elevadíssima responsabilidade do cargo exige.

Chega de "vida de gado".

E você, caro leitor do Recortes Críticos, o que pensa sobre a questão?

sábado, 28 de julho de 2012

Marcuse sem ponto final




De um lado a capacidade de reagir, de dizer não à cultura puramente afirmativa, oca e desprovida de base, própria de um tempo sem identidade. 

De outro,  a necessidade de fugir da alienação irritante do que está posto e dado para flertar no caminho prospectivo e florido das potencialidades.

Preservar, enfim,  o cuidado labiríntico para que o indivíduo não se dilua no pó sedante da massificada indústria cultural e possa manter seu universo de fantasia.

Democracia e revolução em meio à reflexão: ingredientes capazes de permitir a construção de uma civilização relativamente livre do rastro cego da unidimensionalidade, das falsas necessidades da sociedade hipertecnológica, verdadeira prisão sem grades.

Welfare ou Warfare? Prazer e realidade? Princípios e Contradições.

De certeza, a convicção de que a  economia e suas trocas banais não bastam...assim como de nada serve a crítica desacompanhada da práxis transformadora. 

Na pauta permanente continua em debate o  indivíduo e seu papel de mudança social...

Fugir da alienação para  mergulhar na realidade na busca desesperada uma nova sensibilidade capaz de acordar e abrir olhos (e antolhos) para fazer ver no capitalismo a “catástrofe da essência humana”.

Eis o desafio da “filosofia concreta” e da vida autêntica...

Que o tempo tenha cor e cheiro de 1968...que a energia utópica circule sem freios ou drenos. A Teoria Crítica e a Escola de Frankfurt, por uma de suas vozes, ainda tem muito a dizer...

Simplesmente Marcuse...sem ponto final

domingo, 10 de junho de 2012

Por uma nova comunicação social no Brasil: revisitando o legado da Semana da Arte Moderna para repensar o papel da imprensa




"na música são ridículos, na poesia são malucos e na pintura são borradores de telas" Oscar Guanarabarino

"Precisa-se de um moço honesto que saiba fazer versos futuristas. Exige-se um atestado de ignorância" O Estado de São Paulo, 18 de fevereiro de 1922, p. 2.

A forma como a grande massa da elitista imprensa brasileira reagiu à Semana da Arte Moderna em 1922 é a prova de que a pauta crítica dos meios de comunicação muitas vezes não pode ser levada a sério. O livro "22  por 22: A Semana da Arte Moderna vista por seus contemporâneos" (Edusp, 2008), organizado por Maria Eugenia Boaventura, é uma ótima fonte nesse sentido.

Percorrer a obra mencionada é perceber o quanto o grupo liderado por Oswald de Andrade e Mário Andrade. também composto por Villa-Lobos, Anita Malfatti, Di Cavalcanti, dentre outros, foi trucidado impiedosamente pela mídia raivosa daqueles tempos.

Entre o passadismo e o futurismo na arte e os caminhos para uma imprensa livre e democrática o caminho ainda é longo.  Se não temos mais o tempo da passagem de cem anos da independência politica do Brasil para que possamos discutir os meios de comunicação social, é fato que estamos a quase duzentos anos sem um projeto consistente de país, sem que os grandes temas nacionais mereçam debate consistente na cotidiana filosofia do jornalismo brasileiro.

Assim como na época da Semana da Arte Moderna coube à Graça Aranha emprestar sua mão forte de "padrinho" progressista aos modernistas, pergunta-se sem cessar quem poderia exercer esse papel nos dias atuais. Democratizar a informação, discutir os grandes temas de interesse nacional, será pedir muito?

Aos meios de comunicação no Brasil, de modo geral, ressalvadas as mesmas exceções, muitas desconhecidas do grande público, parece faltar personalidade e originalidade. Se isso são coisas da complexidade pós-modernista e o mundo todo está do mesmo jeito, fiquemos no recorte da realidade brasileira.

Os exemplos existem aos montes e difundem-se todos os dias. Anuncia-se incisiva e repetitivamente empréstimos para salvamento de bancos espanhóis e não há houve um contraponto sequer...Lê-se matéria no jornal falando sobre a judicialização de direitos na saúde e ela não traz um argumento ou marco teórico sequer, muito menos revela qual a sua ideia de uma saúde pública cuja integralidade todo governo aos poucos quer sequestrar. A morte de um jornalista maranhense que parecia seguir princípios de um  jornalismo de qualidade e interesse público merece pouco mais de que algumas horas de notícia, no espetáculo do crime em si, que sequer avança para cobrar a falta de prioridade e as deficiências de uma investigação aparentemente indigente.

Basta olhar a "grade" (prisional) da rede da televisão aberta no Brasil para perceber que os espaços predominantes estão cercados de culto à celebridade, de pobres programas de auditório...(surpreendentemente não falo das novelas, porque, bem ou mal, quando bem construídas, servem para enfrentar alguns preconceitos, conscientizar a população sobre alguns temas, trabalho feito de modo muito melhor e autêntico do que a maioria dos saudados seriados estadunidenses). No jornalismo aberto, predominam as notícias diárias e fugazes que rendem audiência e apenas isso. Não há  "campo" (Bordieu) para nenhuma outra reflexão mais aprofundada.

Se voltarmos o ouvido para o rádio brasileiro, de maneira geral, exceção feita a algumas emissoras de programação diferenciada, predominam programas de baixa qualidade, cercados pelas piores sonoridades. Os jornalões, por sua vez, ocupam-se dos temas do momento com a mesma e irritante superficialidade; a pauta de hoje é completamente esquecida nos dias seguintes e raras vezes merece algum encadeamento informativo.

Por essas e outras que precisamos pensar num novo marco para os meios de comunicação social no Brasil. É chegada a hora de um barulho parecido com as comemorações de 13 a 18 de fevereiro de 1922. Se ontem houve uma remodelação artística, já é hora dos  meios de comunicação no Brasil passarem por este tipo de processo. Precisamos de uma nova mentalidade, uma nova era no  jornalismo, com características que terão que ser construídas com métodos diferenciados.

Goste-se ou não, a liberdade de imprensa atual soa como verdadeira (e silenciosa) censura. A falta de informação sobre o rumo do país longe da catástrofre e das notícias de todos os dias é tão grande que, admito, hoje reconheço conveniência na perpetuação da tão questionada "Hora do Brasil".

Para cada Caros Amigos, existem muitas Vejas. Para um Juremir Machado, existem outras dúzias de colunistas reacionários e desinformados da pior espécie. Para cada Programa Faixa Livre existem toda a sorte de outras porcarias para se ligar pedindo música e mandando um abraço ao compadre, quando não para uma vil propaganda politica antecipada. E assim a banda toca...ao contrário do que diz a propaganda da Coca Cola, definitivamente, as boas coisas da mídia não  parecem ser maioria. O fantasma de Mário Pinto Serva, pretenso algoz da Semana da Arte Moderna, continua rondando mais do que nunca na mente de diversos seres-aí.

Se antes o Parnasianismo e suas regras era o grande adversário, quem sabe hoje o problema não esteja justamente na falta de regras, uma delas prevista na própria Constituição (artigos 221 a 224 tratam da comunicação social).  O que é fazer restrição à expressão e à informação (artigo 220 "caput")?  Obstaculizar espaços de emancipação crítica do povo brasileiro não é uma forma de censura política, ideológica e artística? (parágrafo segundo do artigo 220). E por que será que estamos cercados de publicidade sobre produtos, práticas e serviços nocivos à saúde e meio ambiente? (parágrafo terceiro do artigo 220).  Contrariamente ao que dita a Constituição, por que será que os meios de comunicação social continuam direta e indiretamente objeto de monopólio e oligopólio?  (parágrafo quinto do artigo 220).  Os princípios de finalidade educativa, artística, cultural e informativa, de promoção da cultura nacional e regional, de estimulo à produção independente, de regionalização da produção, de respeito aos valores éticos e sociais da pessoa (artigo 221 e incisos), onde estão? Daqui a pouco essas normas se vão sem que se sequer tenham um dia chegado à nossa realidade. Diante desse quadro, perguntar o que o Poder Executivo tem feito para renovar concessão, permissão e autorização de rádio e televisão de modo a observar o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal (artigo 223) parece ser uma grande e irônica brincadeira. Ou alguém por acaso conhece um ato do Congresso Nacional que tenha deixado de renovar uma concessão ou permissão, quem sabe  uma decisão judicial (parágrafos terceiro e quarto do artigo 223). E o Conselho de Comunicação Social, existe e funciona de fato? (artigo 224).

Fossemos usar a "régua"de Guanarabarino, citada de pórtico, diríamos o quê da imprensa de hoje? Não me surpreenderia se ignorante e ingenuamente muitos utilizassem deturpadamente uma frase de Sérgio Buarque de Holanda para afirmar: "Somos bárbaros!...Avante".

Avante sim, sempre, mas necessariamente para outra direção. Parafraseando a imprensa lá de trás, cabeça cidadão também não é "bacia de barbeiro". Ontem, uma reforma da arte; hoje, à espera de uma evolução dos meios de comunicação. Que a "boa imprensa", dócil e gentil com os interesses dominantes, seja substituída por algo realmente novo, ainda que incerto.

Assim como a Semana trouxe múltiplas ideias de arte, que possamos ter múltiplas ideias para pensar a comunicação social no Brasil. Sem regulação não chegaremos a emancipação....Por mais que possam haver exageros, eles são naturais e, afinal, como bem disse Mário de Andrade "não se constrói um arranha-céu sobre um castelo moçárabe". Do mesmo mundo que se quis rotular os modernistas brasileiros como amestrados imitadores do "futurismo de Marinetti", que não cometamos o mesmo erro de se classificar como "inimigo da imprensa livre" quem apenas quer fortalecê-la com novos e necessários compromissos, com oxigênio de transformação social cobrada pelo Estado Democrático de Direito que escolhemos.

A tarefa é complexa e difícil, afinal, o ramo da comunicação social, da hoje louvada mídia, cada vez mais influente na vida em sociedade, tal com a arte, "é vastíssimo, é infinito" (Sérgio Buarque de Holanda). Ontem arte pela arte (Victor Cousin), hoje comunicação pela comunicação, desde que sobre novo paradigma.

Chega de repouso, já é chegada a hora de retratarmos o "movimento" e de buscarmos alguma agitação. Se antes Oswald de Andrade preocupava-se com o academicismo inglório da literatura e da arte, o  "caruncho" da grande mídia está aí para ser desafiado, de outro modo não será possível "educar o Brasil" para viver numa democracia de verdade. Aqui exigir-se-á uma certa rebelião, não com o passado da arte, mas com o passado que fez e faz com que nos contentemos com a democratização formal da comunicação social no Brasil. Ela já foi celebrada demais..ela por si só não nos basta...

O problema é que, talvez como a Semana da Arte Moderna de 1922,  é bem provável que faltem patrocínios para esta causa...Não se espere o espaço privilegiado das poltronas de um "Teatro Municipal" para começarmos trabalho. Que venham as sempre lembradas teses de Feuerbach debaixo do braço, não sem antes lembrar que a Gazeta Renana (e a imprensa) abriu mais espaços para o Marx do que a própria universidade. O mais triste de tudo será enxergarmos isso muitas décadas depois...a história teimosamente se repete.